A arte perdida do compromisso
Sem compromisso, nossa vida individualista será árida e  estéril. Sem compromisso, nossas vidas ficarão sem sentido ou propósito
Certas características são tão inerentes ao cristianismo que  negligenciá-las significa tornar-se um crente disforme. Uma delas é o  compromisso. Um cristão sem compromisso é como um paradoxo. O  descompromisso tem sido uma tendência na sociedade moderna. As pessoas  estão cada vez menos comprometidas com suas responsabilidades, com seus  empregadores e até com sua família. Carreira, casamento, amizade e até  mesmo a fé – ou seja, valores enraizados na cultura ocidental – têm sido  abalados ela falta de compromisso, sobretudo entre as pessoas mais  jovens.
E a percepção não é apenas pela mera observação dos fatos e do  comportamento das pessoas. Uma pesquisa feita em 2008 mostrou que mais  da metade das pessoas com idades entre 20 e 24 anos estavam com seu  empregador atual havia menos de um ano. O matrimônio, em especial, tem  sofrido muito com esse quadro. De acordo com dados do último censo  norte-americano, os adultos jovens estão se casando mais tarde do que  nunca. Um documentário produzido pela PBS em 2006, intitulado A  próxima geração, deu algumas dicas sobre o porquê dessa situação  atual: desejo de aventura, interesse em progredir na carreira e  permanência mais prolongada na adolescência.
A falta de compromisso também está atingindo duramente a religião.  Estudos sugerem que a geração iPod chega ao cúmulo de escolher  quais aspectos da fé deseja adotar para criar as suas próprias listas  espirituais.  A religião passa a ser o mesmo, então, que uma lista de  meros interesses pessoais.
Entre os jovens adultos de hoje, a falta de vontade de se comprometer  é alarmante. Eles são filhos de uma geração que viveu o apogeu da  contracultura, entre as décadas de 1960 e 70, e expressam tal sentimento  em seu apogeu. Em 1979, o sociólogo Robert Bellah realizou extensas  entrevistas e pesquisas para compreender os chamados “hábitos dos  corações” dos americanos médios. Muitos deles não tinham nenhum senso de  comunidade ou obrigação social e viam o mundo como um lugar fragmentado  de escolha e de liberdade, sempre no objetivo de obter o máximo em  realização e conforto pessoal. Instados a expressar alguma forma de  compromisso com algo ou alguém além de si mesmos, a maioria quedou-se  silente.
Bellah chamou este comportamento de “individualismo ontológico”, uma  crença não codificada segundo a qual o indivíduo é a única fonte de  significado. O estudioso previu então como essa atitude iria, com o  passar do tempo, afetar a sociedade em geral e até a Igreja. Como se vê,  acertou em cheio. Desde então, temos visto uma quase ininterrupta  marcha em direção ao autofoco, afetando todas as nossas instituições,  mas sobretudo o trabalho, o casamento e a família.
Os blocos básicos da construção de uma sociedade pode se corroer se  não existir compromisso daqueles que a compõem. No caso da Igreja, é  cada vez mais urgente ensinar isso. Afinal, como é possível pensar em  ser cristão sem um compromisso voluntário e total com a pessoa de Jesus?  Por outro lado, além das ramificações para a sociedade como um todo,  quando tal compromisso é recusado o mesmo negligenciado, perde-se uma  das grandes alegrias da vida. Quando focamos tudo sobre nós mesmos,  perdemos o grande sentido da existência, que outro não é senão conhecer e  servir a Deus e amar e servir a nosso próximo.
Isso ficou claro quando 33 cientistas pesquisadores investigaram a  relação entre o desenvolvimento humano e da comunidade em um importante  relatório chamado Hardwired to connect. A pesquisa revelou que o  ser humano é biologicamente preparado para encontrar sentido através de  relacionamentos. Depois de quase oito décadas de vida, posso  testemunhar sobre isso. Minha alegria maior é dar-me aos outros e vê-los  crescer como conseqüência disso. É impossível descobrir isso sem que  tenha compromisso com alguém. A primeira vez que aprendi isso foi  presenciando meus pais cuidarem de meus avós, de maneira amorosa e  espontânea, até o fim de suas vidas.
Vi isso também quando estava no Corpo de Fuzileiros Navais. Lá,  ensinava-se aos recrutas como eu que compromisso com o companheiro de  farda é tudo. Aprendi que, uma vez em combate, eu certamente morreria se  o homem mais próximo a mim não me cobrisse, e vice-versa.
Esse tipo de compromisso total, feito de amor um pelo outro, é o que  precisa acontecer nas igrejas. Ao abandonar o compromisso, a nossa  cultura narcisista perdeu a única coisa que procura desesperadamente: a  felicidade. Sem
compromisso, nossa vida individualista será árida e estéril. Sem  compromisso, nossas vidas ficarão sem sentido ou propósito. Afinal, se  não se vale a pena morrer por nada, também não vale a pena viver. Mas,  com o compromisso, vem o florescimento da sociedade – de vocação, do  casamento, da Igreja – e dos nossos corações. Esse é o paradoxo de  Jesus, tantas vezes compartilhado quando o Senhor nos oferece para vir e  morrer, a fim de que possamos verdadeiramente viver.
Charles Colson & Catherine Larson
Fonte: Cristianismo Hoje 

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