RAZÃO  E SENSIBILIDADE
“Eis  que vos  envio como ovelhas ao meio de lobos; 
portanto,  sede prudentes  como as serpentes 
e  simples como as pombas” (Mt 10.16)
  
 O  filme inglês Razão e Sensibilidade   (1995) narra a história de duas irmãs que diante das dificuldades   financeiras da família adotaram formas diferentes de enfrentar a vida:   uma, mais  prática, valeu-se da razão como condutora de suas decisões e a  outra  apoiou-se  na emotividade como resposta. Na verdade, e a grosso  modo, este é um  pêndulo que  todos nós precisamos aprender a nos  equilibrar. 
Carl  Gustav Jung desenvolveu a teoria que  possuímos  quatro  funções psicológicas fundamentais:  pensamento,  sentimento, sensação e  intuição.  A seu ver, saudável é  aquele  capaz de transitar bem em cada uma dessas funções, para poder dar  a   melhor resposta que o momento exige. Coisa difícil, pois o problema é   que  costuma haver a preponderância de uma delas, que ele chama de  “função  superior”,  e uma conseqüente dificuldade de transitar pelas  outras  funções.
Jesus  deseja trazer unidade, equilíbrio e  estabilidade à nossa personalidade.  Da mesma  forma que o Eterno  organizou o caos do Universo, ele também pode trazer  harmonia  e beleza  a cada um de nós. Ao preparar seus discípulos para enfrentar as  duras   experiências da vida de fé, Jesus adverte-lhes para que fossem “prudentes  como as serpentes e simples como  as pombas”. Ou seja, o Mestre os  instrui para combinar a prudência,  sagacidade e inteligência própria  dos ofídicos, aliada à simplicidade  das  pombas. Numa tradução mais  livre, que complementassem a razão com a  sensibilidade.
Quando  não desenvolvemos adequadamente a  razão, tornamo-nos presas fáceis  dos enganos e sofismas, e alguns,  “tendo  rejeitado a boa consciência, vieram a naufragar na fé" (1Tm  1.19).  Somente crer  não basta: também é preciso pensar corretamente.
Abandonando  a razão e a boa consciência, nos  tornamos como irracionais, e foi isso  que quase  levou o salmista  Asafe a “escorregar”. Mas ele confessa e reconhece a  origem de  seu  problema: “eu estava embrutecido e ignorante; era como um irracional  à  Tua  Presença” (Sl 73.22).
A  irracionalidade nos aproxima dos animais e  nos leva a agir  mediante impulso. “Não sejais como o  cavalo ou a  mula, sem entendimento” (Sl 32.9), diz a bíblia. Confesso  que os  erros  cometidos em minha vida – e não foram poucos –  quase  sempre ocorreram  quando deixei a  razoabilidade de lado. Ao abandonar a racionalidade,  passamos a decidir  com o  fígado. Creiam-me: a bílis é uma péssima  conselheira.
A  primeira vítima do agir irracional é o  diálogo. Já tentou conversar, num  bom  nível, com alguém exasperado?  Desista, pois as palavras que você diz  nunca serão  as palavras  ouvidas. Muitos confessam depois: “fiquei como fora de mim”.  Ora,  quem  está “fora de si” não tem como analisar corretamente o que estão  lhe   falando. Peça para alguém irado definir algumas pessoas ao qual não   mantém bom  relacionamento, e você verá o quanto a raiva “deforma” e  “demoniza” o  outro. É  por isso que Paulo pede que sempre  “a paz de   Cristo seja o árbitro no  coração”.
Há  sempre a possibilidade de o pensamento  tornar-se a “função superior”.  Até aí nada demais, porém se ele estiver   desacompanhado da sensibilidade, para lhe dar equilíbrio, sensatez e   temperança,  o resultado pode ser nefasto.  A  posse da razão, sem o  freio da sensibilidade,  torna  as pessoas cruéis, cheias da  “verdade”.  Deus nos livre dos cheios de razão.
Quando  os aspectos saudáveis da  sensibilidade são rejeitados, sem possibilidade  de  aflorar para fazer  parte da personalidade, acaba por deixar a pessoa  “pesada”,   faltando-lhe a leveza, o bom-humor, o chiste. Ora, tudo que é rejeitado   em nós  ou impedido de se manifestar não pode contribuir no  desenvolvimento do  ser. E o  que é pior: adoenta. 
Por  outro lado, possuir sensibilidade sem o  apoio da razão produz gente  “hipersensível”, que faz drama dos menores e  irrelevantes  acontecimentos, dá um  valor excessivo aos seus  sentimentos, e o mundo é visto e julgado – não a  partir  da realidade –  mas do que ele está sentindo. É claro que se decepciona  facilmente com  todos que o cercam, e vive em constante flutuação  emocional.   
É  preciso saber para que lado pendemos e que  aspectos importantes da vida  não  estão sendo vivenciados. O Senhor  espera de nós um desenvolvimento de  todas  as funções próprias de uma  personalidade saudável. Se assim não for,  ficaremos  eternamente presos  às reações infantis, e aos pensamentos próprios da  adolescência. 
As  coisas espirituais são assim: requerem o  empenho da totalidade da  constituição  de nosso ser, para que não  sejamos cristãos “mancos” que vivem  parcialmente de  suas funções. É  por isso que somente podemos amar a Deus de verdade se  for de  todo  nosso coração, toda nossa alma, todo nosso entendimento e toda  nossa  força  (Mc 12.30).
Por Pr.  Daniel Rocha
Via: Cris Frenesi 

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