Os vendilhões do templo 
Chegando a Jerusalém, Jesus entrou no templo e, com um azorrague de cordéis, começou a expulsar os que estavam comprando e vendendo. Enxotou os bois e ovelhas, derrubou as cadeiras dos que vendiam aves, virou as mesas dos cambistas, e espalhou o dinheiro pelo chão. E lançando todos para fora do templo, disse: A minha casa será chamada casa de oração para todos os povos. Mas vocês fizeram dela um covil de ladrões (Mateus 21.13; João 2.15).
Se naquele tempo os homens  faziam da casa de Deus uma praça de mercadores, hoje, além do comércio,  eles a transformaram em lugar de exploração da fé. Ali, dissimulando  seus fins lucrativos, eles oferecem a solução de problemas pessoais,  como desemprego, vícios e brigas conjugais, e ainda bênçãos materiais ou  físicas, como prosperidade e cura de doenças.
Imagine Jesus em pleno século  XXI entrando no templo, hoje representado por essas igrejas-empresas e  suas respectivas filiais, televisivas ou não, que proliferam por todo o  canto. Qual seria a reação de Cristo ao constatar que a finalidade única  dos pastores dessas igrejas é seduzir o povo para arrecadar dinheiro, a  fim de que possam ampliar seus “ministérios”, aumentar seu patrimônio e  engordar suas contas particulares? Sem dúvida, usando os mesmos termos e  aplicando a mesma energia, Jesus expulsaria os vendilhões desses  pseudotemplos evangélicos e poria ordem na casa.
Desprovidos de respeito pelo  que é sagrado, ainda destituídos de pudor e sem o mínimo de temor de  Deus, os pastores dessas igrejas nem se dão conta de que a igreja  bíblica é o Corpo de Cristo, uma instituição divina, essencialmente  pura, que não constitui empresa de eventos que visam a vantagens  financeiras, e que o púlpito não é tribuna de leilão de bênçãos. Ali,  descaradamente, chegam a propor o “trízimo”, em vez do dízimo, em troca  de benefícios materiais. Tais pastores são incapazes de perceber que a  igreja não é lugar de falcatruas, nem de comércio, muito menos de  exploração da fé, como no caso da escandalosa troca de bênçãos por “água  benta”, e da intencional pregação da prosperidade visando recolher  ofertas cada vez maiores.
Jesus disse que edificaria  sua igreja e que as portas do inferno não prevaleceriam contra ela. Nada  do que é escuso haveria de contaminá-la. Ele a chamou “casa de oração”,  portanto um lugar de comunhão com Deus, de louvor e adoração, onde os  crentes, conduzidos por pastores fiéis, regozijam-se num evento  espiritual, feliz e auspicioso, aclamando o Senhor com cânticos de  alegria. Ali os crentes se reúnem para ouvir a exposição genuína da  Palavra de Deus, tanto para conhecerem os ensinamentos de Jesus quanto  para serem edificados na fé. A “casa de oração” é o lugar em que Deus se  faz presente para abençoar seu povo.
Nessas reuniões, os fiéis  ainda entregam seu dízimo e suas ofertas voluntárias para a manutenção  da obra de Deus, e o  fazem com prazer, pois está escrito que Deus ama os que contribuem com  alegria (2Coríntios 9.7). Tais contribuições, porém, são feitas única e  exclusivamente para suprir as necessidades da própria igreja a que  pertencem, jamais para ajudar outros “ministérios” ou para satisfazer a  ambição de pastores ilegítimos com seu sistema empresarial de igrejas,  rádio e TV.
A propósito, a igreja, em  essência, é missionária e evangelizadora. É o lugar em que os pecadores  são recebidos para serem salvos, de acordo com o plano da redenção, em  Jesus Cristo. Por isso, é primordial que ela se preocupe, antes de tudo,  em alcançar os não convertidos. Jesus passava por todas as cidades e  povoados, ensinando nas sinagogas, pregando o evangelho do reino e  curando os enfermos (Mateus 9.35). Observe-se, porém, que antes de curar  os doentes, ele pregava as boas novas de salvação.
Antes de sua ascensão, ele  determinou aos seus discípulos: “Vão pelo mundo todo e preguem o  evangelho (a boa nova de salvação) a todas as pessoas. Quem crer e for  batizado será salvo, mas quem não crer será condenado” (Marcos 16.15).  Ele não disse: “Vão pelo mundo, ofereçam a todos a solução dos problemas  pessoais e materiais e curem os enfermos”. Na verdade, o que ele  ressaltou foi a pregação do evangelho.
É certo também que a igreja é  o lugar em que os enfermos são acolhidos para serem curados pela fé, em  nome de Jesus, pois ele disse que os sinais seguiriam aos que crêem.  Saiba, no entanto, que a cura divina, prometida aos crentes, não deixa  dúvida de que é verdadeira, como também não deixa suspeita de que é  falsa. Os milagres da Bíblia, como a ressurreição de Lázaro, a cura do  aleijado na porta Formosa, a cura do paralítico Enéias e tantos outros  foram feitos e testemunhados publicamente: nunca houve dúvida de que  foram realizados por Deus.
No entanto, a cura divina e  outros eventos promovidos pela fé são milagres operados com uma  exclusiva finalidade: despertar as pessoas para que creiam em Jesus e  sejam salvas. A missão central de Cristo na terra não foi repartir  bênçãos pessoais, físicas ou materiais. Não poderia ter sido nenhuma  outra, senão a salvação de almas. Essa foi a única razão pela qual Jesus  veio ao mundo. Ele próprio disse que veio “para buscar e salvar o que  estava perdido” (Lucas 19.10). Ele “veio para dar a sua vida em resgate  por muitos” (Mateus 20.28) e “para que todo o que nele crer não pereça,  mas tenha a vida eterna” (João 3.16).
De fato, prega-se primeiro a  mensagem da salvação da alma; depois, a promessa dos bens materiais e  físicos. Primeiro o Reino de Deus e sua justiça: as outras coisas serão  acrescentadas (Mateus 6.33). Isso é justo, pois, com a salvação, pode-se  chegar ao céu, mesmo estando pobre ou doente. Nunca, porém, sem ela,  ainda que se esteja rico ou com saúde.
Grande parte das igrejas de  hoje, em vez de serem igrejas missionárias, tornaram-se empresas  mercenárias. São antítipos modernos da igreja de Laodicéia, uma das  cinco igrejas da Ásia que se desviaram do Caminho, e por isso foram  repreendidas por Jesus através de João na ilha de Patmos. O pastor dessa  igreja, presunçoso, dizia: “Estou rico e não preciso de nada”. Não  reconhecia, porém, que espiritualmente era um miserável, digno de  compaixão, pobre, cego, e que estava nu. Nem se deu conta de que ele  próprio e sua igreja, em plena apostasia, já haviam rejeitado a Jesus e o  mantinham do lado de fora do templo. Por isso, precisou Cristo bater em  sua porta, instando que se arrependessem e fossem restaurados  (Apocalipse 3.14-22).
O estilo da igreja de  Laodicéia foi assumido inicialmente por considerável parcela de pastores  americanos, em meados do século XX, e depois foi exportado para outros  países, chegando ao Brasil nos anos de 1960. Em nosso país, uma das  pioneiras a seguir esse estilo de igreja espúrio foi a IURD, dirigida  pelo bispo Edir Macedo. Alguns pastores o adotaram e foram seguidos por outros, que se  reproduziram e hoje se espalham por toda a nação. São pastores  considerados homens ricos, aliás, semelhantes ao pastor da igreja de  Laodicéia. 
Além da frivolidade  espiritual e do esvaziamento teológico, a prática ordinária dessas  igrejas é o mercantilismo, a egolatria, a permissividade sexual, as  negociatas políticas e tantas outras mazelas que acabaram manchando o  legado histórico da igreja de Cristo. Os líderes dessas igrejas não  servem a Deus a favor dos homens. Pelo contrário, servem-se de Deus para  enganar os homens e ainda se locupletarem. Para eles, o cristianismo é  um simples, porém eficaz meio de arrecadar dinheiro.
Eles não sentem compaixão  pelos pobres, nem pelas almas que se perdem no mundo. Insensíveis,  desprezam a mensagem da salvação, da renovação espiritual, da  santificação e da vida eterna. Para eles, isso é tolice de crentes  obstinados. Ignoram ainda o fato de que boa parte do dinheiro que  arrecadam vem de pessoas humildes, que mal tem o que comer — para  economizar o dinheiro das ofertas, muitos vão a pé para a igreja!
Que quadro triste! Que fatos  vis! Que coisa infame! Mas que não se iludam esses falsos pastores,  porque a respeito de suas obras a Bíblia é incisiva: “De Deus não se  zomba. Pois o que o homem semear, isso também colherá” (Gálatas 6.7).
Com efeito, parafraseando o  célebre texto das nulidades, de Rui Barbosa, os pastores que, resistindo  às forças do mal, permanecem fiéis a Cristo poderiam declarar — como de  fato declarado têm — que, de tanto ver triunfar os males do ministério  cristão, de tanto ver prosperar sua desonra, de tanto ver crescer em seu  meio a injustiça, de tanto ver agigantarem-se em suas mãos os poderes  temporais, chegam a desanimar da virtude, a rir-se da honra e a ter  vergonha de se chamarem pastores evangélicos.
PEDRO  LIASCH FILHO
Fonte: Martelo de Deus 

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